as vozes, às vezes
são sons que parecem
timbres instrumentais
Seu João do sindicato
parece um trombone
com sua voz alta
e grave
falando de greve
Dona Suely é uma flauta
transversal soprano
solando arpejos repetidos
de cremes da Avon
o professor Gilberto
fala tanto
de poesia
que suas teclas
já estão desafinadas
Ana, Cristina e Isabela
um naipe de metais:
se encontram
e ninguém fala mais
Jeremias tem a fala
suingada como um violão
tocando uma bossa-nova
no ouvido das meninas
como um violoncelo
é a voz de Joaquim
dando conselhos ao seu neto
ou falando de política
minha voz é sintética
artificial e estranha:
um sintetizador desafinado
mas não importa o timbre
é isso que uma cidade
um pais o mundo são:
imensas orquestras
tocando temas
complexos
bonitos
terríveis
e regidas pelo caos
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